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COLUNA VERTICAL

"A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras.." (Aristóteles)

COLUNA VERTICAL

"A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras.." (Aristóteles)

12 Ago, 2013

Repórter X

Capa Bocage final.JPG

 

O jornalista vive de emoções,

Sem se preocupar com desmentidos

Ou depoimentos falsos ou fingidos,

Tudo fazendo em prol das t’levisões.

 

Criador de boatos, de ilusões

(os artigos sensatos não são lidos),

Dou  o que o povo quer: mortos, feridos,

Assaltos, corrupção, violações.

 

Gente séria, de bem, não tem saída,

Da política só gente corrupta

Interessa que seja promovida.

 

Pelo que é sórdido é a nossa luta,

Eis o objectivo desta nossa vida.

Enfim, somos uns bons filhos da puta.

 

Lisboa, 30 de Outubro de 2005

12 Ago, 2013

A DESILUSÃO

Vasco Pulido Valente - Público de 9-8-2013

 

O Diário de João Chagas, publicado postumamente depois do "28 de Maio", é um dos melhores livros de memórias políticas de uma literatura que não se distingue no género. Chagas tinha sido um dos participantes na tentativa de revolução de 1891, degredado para África, exilado e revolucionário do "5 de Outubro", além de ser também, e até ao fim, um admirável escritor (que hoje, evidentemente, ninguém lê). Em 1914, embaixador em Paris, observando de longe as desordens da pátria, começou o Diário, que, no fundo, não passa da história da sua desilusão com a República, por que tanto tinha esperado e sofrido. Essa desilusão, que não seria estranha a uma boa parte do partido liberal, nem à gente da Monarquia no fim do século XIX, aparece agora outra vez nos poucos sobreviventes da ditadura, que receberam o "25 de Abril" como a esperança de um novo Portugal e a justificação de uma vida.

 

Durante anos, Chagas viu de longe a dissolução da República: o terror que o Partido Democrático lentamente instalara, as querelas entre os partidos que se formaram na Constituinte, o oportunismo sem vergonha ou limite da nova "classe dirigente", o desprezo geral pela legalidade e a preponderância inevitável dos "negócios", em que ninguém tocava. Afinal, a República acabara por se tornar numa Monarquia em pior; e ele, impotente e sozinho, assistia exasperado à aproximação, cada dia mais certa, da catástrofe final. A "impostura" que se instalara não podia durar; e ele ficava perturbado com a facilidade com que os portugueses (mesmo amigos seus) participavam sem um abalo naquela extraordinária hipocrisia institucional.

 

A II República (ou a III, como quiserem) entrou quase sem sentir num caminho parecido. Com o tempo, os partidos deixaram de ser o instrumento de um programa ou de uma ideia e desceram ao estatuto tradicional de bandos sem princípios, que disputam com ódio o cadáver do Estado; a irresponsabilidade com que acumularam uma dívida absurda para ganhar alguns votos por aqui e por ali e solidificar a sua posição levou o país (que nunca verdadeiramente informaram) a dezenas de anos de miséria; os "negócios", como se verificou esta semana, continuam a reger a autoridade democrática; e da corrupção nem vale a pena falar. Claro que não existe qualquer risco de uma ditadura à Salazar; nem a "Europa" a permitiria, nem o exército (agora profissionalizado) a sustentaria. Mas, no meio da balbúrdia e do escândalo, essa consolação é curta. A oportunidade democrática que o "25 de Novembro" e a adesão a Bruxelas nos trouxeram já se perdeu.