por António Belém Coelho
O Senhor F. é empresário em nome individual. Toda a sua vida, desde que abandonou a Escola e se viu obrigado a trabalhar para ganhar o seu sustento, lá fez das tripas coração para levar o seu negócio a bom porto.
A coisa não tem corrido mal de todo e até há pouco tempo, já tinha a trabalhar para si três empregados.
Entretanto chega a crise, que é para todos, mas não igual para todos, sublinhe-se, e os negócios começam a ir de mal a pior.
Depois de tudo o que tem visto nas TVs e noutros órgãos de informação, o Sr. F. achou-se no dever e no direito de solicitar um qualquer apoio que lhe permitisse prosseguir com o negócio e sobretudo salvaguardar os três postos de trabalho que considerava sua responsabilidade e que sustentavam outros tantos agregados familiares.
Depois de muitas e inúmeras deslocações, tempo de espera, e-mails, consultas, e outras ocupações de tempo, foi informado de que para o seu caso não existia qualquer mecanismo de apoio face a esta situação.
Acontece que o Sr. F., mesmo sustentando o seu e mais três agregados familiares não insere a sua actividade no sector bancário; e falamos daquele mais tradicional, que acolhe os depósitos dos cidadãos e depois os procura rentabilizar, mediante aplicações disponíveis no mercado global.
E quanto a estes, tudo bem; estamos perfeitamente de acordo que o Governo assegure por cidadão, um mínimo de garantia de € 100 000,00; até iríamos mais longe, estabelecendo um limite maior, de € 150 000,00 ou mesmo € 200 000,00.
Mas isso são questões meramente aritméticas e políticas.
Entretanto o Sr. F. contrapôs a quem teve a paciência de o ouvir, que outras instituições bancárias, que pouco ou nada têm a ver com as poupanças do cidadão, mas que estão dirigidas à gestão das grandes fortunas e aos investimentos de alto risco, comprometeram, com o aval do Estado, milhares de milhões para salvaguardar tais situações.
Conversa em saco roto; tivesse o Sr. F. investido em operações de alto risco, de preferência com dinheiro que não fosse seu e talvez agora fosse contemplado com esta tábua de salvação!
Mas o Sr. F. ainda teimou para grande espanto e contrariedade de quem fez o favor de o atender! É que estava no negócio dos carrinhos de linhas, tão e cada vez mais necessários a uma elevada percentagem de população que não tem dinheiro para novas roupas e que tem de adaptar as antigas!
Tempo perdido! O zeloso funcionário informou-o de que se fosse industrial dos carrinhos a sério, então teria direito a todos os apoios e mais alguns, até a crise passar; desde apoios para manter toda a sua força de trabalho, a incentivos fiscais aos investimentos e mesmo a venda de terrenos a preços simbólicos, para sabe-se lá quando, puder haver investimento.
Aqui, o Sr. F. perdeu as estribeiras e questionou: «Então, o mesmo Estado que afunda o sector automóvel, impondo impostos elevadíssimos e mesmo impostos sobre impostos, para não falar do novo imposto de circulação e do elevado preço dos combustíveis, que obrigam os Portugueses a ter um parque automóvel de pequena cilindrada quando comparado com os seus congéneres Europeus, vem agora gastar milhões e milhões dos nossos impostos para os salvaguardar?»
Bom, aqui o nosso Sr. F. começou a perceber a diferença entre filhos e enteados; mas não conseguiu perceber a diferença entre um qualquer Governo de maioria de direita radical e um Governo que se diga e socialista e actue enquanto tal. Nem nós!
Moral da história: ou és banqueiro ou estás no ramo do sector automóvel; caso contrário, será difícil teres apoios para a crise.
Mas todos a sentem! Uns mais que outros! Lá dizia Orwell!