A minha intervenção no plenário do PSD de Abrantes
Santana-Maia Leonardo - Intervenção no plenário do PSD de Abrantes de 19/3/2011
Saí do plenário do passado dia 15 de Janeiro convencido, tendo em conta o tom moderado e apaziguador de todas as intervenções, de que o PSD tinha, finalmente, conseguido encontrar um novo caminho e um ponto de equilíbrio entre as diferentes individualidades que o compõem, assente no respeito mútuo, nas garantias de democraticidade interna, na liberdade de opinião e no respeito pelos estatutos.
Pelos vistos, fui demasiado optimista.
Pelo facto de ser vereador, pertenço, por inerência do cargo, a uma comissão política que termina o mandato no final de 2011. Qual não foi, pois, a minha surpresa quando recebo por mail, no passado dia 24 de Janeiro, um comunicado assinado pela presidente da comissão política que, entre outras coisas, dizia o seguinte: «Vamos solicitar ao Sr. Presidente da Mesa da Assembleia do PSD de Abrantes, a marcação de eleições» (DOC.1).
Vamos?!... Vamos?!... Mas tinha havido alguma reunião da comissão política para se tomar esta decisão e aprovar este comunicado? Já alguém se tinha demitido? A presidente não se tinha demitido certamente, uma vez que era ela que assinava o comunicado e reunião também não tinha havido porque não foi convocada.
Em todo o caso, à cautela, liguei aos dois vice-presidentes que me informaram que nem se tinham demitido, nem tinha havido qualquer reunião para aprovar aquele comunicado. Por sua vez, no Facebook da comissão política (o local privilegiado para a divulgação de informação do partido, segundo o comunicado público de 15 de Janeiro), nem informação da demissão da comissão política, nem da convocação de eleições.
Sem que mais nada se tivesse passado entretanto, no passado dia 25 de Fevereiro (6ª Feira), recebo no meu mail uma convocatória de eleições para a concelhia a realizar no dia seguinte (dia 26 de Fevereiro, sábado), com a informação de que «as listas de candidatos deverão ser apresentadas ao Presidente da Mesa da Assembleia até às 24 horas do terceiro dia anterior ao do acto eleitoral» (DOC.2) (????!!!!...).
Ou seja, os militantes e os membros da comissão política (não alinhados com o novo alinhamento da senhora presidente, obviamente) tomaram conhecimento da antecipação das eleições para a concelhia na véspera da eleição, ao mesmo tempo que eram informados de que o prazo para apresentação de listas já tinha terminado. E tinha terminado não só o prazo para apresentação de listas como também o prazo para o pagamento das quotas que os habilitavam a participar nas eleições, quer como candidatos, quer como eleitores.
Isto é que é um partido transparente e democrático?!... Se o Salazar se tivesse lembrado disto, podíamos ter vivido 48 anos em democracia...
Recordo que a anterior comissão política e a mesa da assembleia solicitaram, expressamente, a todos os militantes para lhes fornecerem o seu mail de contacto, para receberem, em primeira mão, todas as convocatórias e comunicados.
Quer dizer, enchem-nos a caixa de correio do mail com comunicados e convocatórias repetidos a propósito de acontecimentos menores, mas não há oportunidade para enviarem aos militantes e aos membros da comissão política em funções um comunicado ou uma simples informação a dar conta da demissão da comissão política e da data das eleições ou a convocatória das mesmas com a antecedência estatutariamente devida?!...
E, para a comédia ser completa, só faltava agora mais um momento Chavez dos nossos presidentes garantindo que cumpriram religiosamente o Regulamento Eleitoral, tendo afixado a convocatória na sede em local bem visível. Visível para quem tivesse a chave da sede, bem entendido, porque a sede, à cautela, esteve sempre fechada até ao acto eleitoral, não fosse alguém retirar a convocatória de local tão visível.
Forçoso será, pois, concluir que os órgãos sociais, assim, eleitos tem, certamente, legitimidade democrática na Venezuela e em países afins, não têm, obviamente, legitimidade democrática, à luz dos princípios estruturantes das democracias liberais que o nosso partido professa e que estão, aliás, bem expressos nos estatutos e até no artigo 1º, nº1, do Regulamento Eleitoral. E se há alguém no nosso partido que desconhece os princípios estruturantes das democracias liberais era bom que os fosse aprender, até porque ninguém devia ser admitido como militante se os desconhecer, nem devia manter-se como militante se os violar.
Isto é tão evidente que basta comparar com a forma como foi convocada esta assembleia de militantes. Esta assembleia foi convocada por mail enviado aos militantes no dia seguinte à sua publicação no Povo Livre. Além disso, ainda foram enviados mais dois sms de confirmação. Por sua vez, a assembleia eleitoral foi convocada por mail, na véspera do acto eleitoral e trinta dias depois da publicação no "Povo Livre".
Respondam com honestidade, qual das duas convocatórios é mais importante e urgente para os militantes: a convocatória desta Assembleia ou a convocatória de uma Assembleia eleitoral em que há prazos para a entrega de listas, para recolha de assinaturas e para pagamento de quotas?
Tudo isto seria ridículo, se não fosse triste porque revela o perfil de alguns dos nossos dirigentes concelhios. A geração Sócrates, pelo vistos, também já tomou conta da nossa secção. Mas isso não deve ser motivo de orgulho para nós. Muito pelo contrário. Como todos sabemos, a geração Sócrates é uma geração que aprendeu a usar os princípios e os valores apenas como arma de arremesso para agredir os adversários, sem nunca os aplicar às suas condutas, que se regem apenas pelos seus mais mesquinhas interesses particulares. Ou seja, é uma geração sem princípios que não olha a meios para atingir os seus fins.
Os socialistas fazem o mesmo? Claro que fazem, mas os socialistas não devem servir de exemplo para ninguém. E o que ganha o povo português em trocar o PS pelo PSD, se os sociais-democratas, até numas simples eleições concelhias, privilegiam a golpada, a esperteza saloia e o"chico-espertismo? E não vale a pena desvalorizar estes pequenos episódios partidários, porque é, precisamente, nas pequenas coisas que as pessoas se revelam.
A senhora presidente agiu não só com má fé e com reserva mental como usou em benefício próprio informação privilegiada que estava obrigada a partilhar com os militantes e os restantes membros da comissão política, violando descaradamente o princípio da confiança que os militantes e os membros da sua comissão política devem ter no presidente da concelhia de que este os informará, designadamente, por mail e pelo Facebook, como lhes foi garantido em plenário de militantes, das informações relevantes do partido.
Quando me candidatei pelo PSD a presidente da câmara, fi-lo em nome de um concelho mais democrático, livre e participativo e contra a corrupção, o compadrio e o clientelismo. E estes princípios não são sequer negociáveis. É, por isso, com profunda tristeza e vergonha que assisto, dentro da minha própria secção, ao alastrar de um mal que nos propúnhamos erradicar e combater se ganhássemos as eleições autárquicas.
Como pode um partido prometer, com seriedade, a regeneração do concelho ou do país, quando não consegue sequer regenerar-se a si próprio? Como dizia Aristóteles, «o princípio é a metade de tudo». E se o PSD de Abrantes quer, na verdade, ser o motor da regeneração concelhia então deve começar pelo princípio. Ou seja, por si próprio. Até porque não há outra forma de começar.
Face exposto e à gravidade e ao caricato da situação, quero deixar clara, desde já, a minha posição, para não alimentar mais polémicas:
1. No dia em que a secção de Abrantes do PSD decidir começar a respeitar as regras e os princípios de funcionamento característicos das democracias liberais, poderá contar com a minha participação, colaboração e disponibilidade.
2. Enquanto continuar a adoptar as regras de funcionamento típicas da democracia venezuelana, contará, inevitavelmente, com o meu distanciamento e a minha oposição frontal, reservando-me o direito, em nome da dignidade dos vereadores e da defesa dos princípios fundamentais das democracias liberais, de tornar público este documento.
Abrantes, 19 de Março de 2011
O militante nº8513
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