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COLUNA VERTICAL

"A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras.." (Aristóteles)

COLUNA VERTICAL

"A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras.." (Aristóteles)

31 Mar, 2013

A LIÇÃO DE CHIPRE

João Pereira Coutinho - CM de 30-3-2013

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Henrique Monteiro escrevia ontem no ‘Expresso’ que a solução encontrada para o Chipre tinha tudo para agradar à esquerda: uma lavandaria de dinheiro vai à falência e quem paga a conta não são os contribuintes, nem os pequenos aforradores. São os donos da lavandaria e, vá lá, o ‘grande capital’ lá enfiado. Por que motivo, então, o Chipre desperta tanta indignação entre as cabeças igualitárias?

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Com a devida vénia ao Henrique, arrisco uma resposta: não, não é porque a solução encontrada destrói a confiança bancária, ou o euro, ou até a economia de um país (as razões válidas). Chipre provoca urticária mental porque persiste ainda entre as crianças a ideia infantil de que os países do Norte devem pagar os desvarios do Sul. Em Chipre, os desvarios da banca. Em Portugal, os desvarios da dívida.

31 Mar, 2013

SORTE E AZAR

Alberto Gonçalves - DN de 31-3-2013

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(...) Por sorte, não faltam possibilidades para criticar indevidamente o Governo. Por azar, também não faltam razões para criticá-lo devidamente, sobretudo quando há ano e meio desperdiça uma oportunidade ímpar para aproveitar o embalo da crise e, ao menos por desfastio, reformar dois ou três pedacinhos do país - seja na Justiça ou no ensino, no trabalho ou na administração pública. No dia em que a poeira se dissipar, verificaremos que os transtornos do inevitável empobrecimento não serviram para curar uma só maleita pátria: serviram a preservação desesperada do Estado socialista (...)

Vasco Pulido Valente - Público de 31-3-2103

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Coisa estranhíssima num país católico, ou que se diz católico, quase ninguém discutiu a política do novo Papa, já mais do que evidente. E essa política é importantíssima para a América e para a Europa, onde a Igreja passa pela sua mais grave crise de sempre. A maioria dos católicos aproveita da Igreja o que lhe convém e rejeita o resto. A doutrina ortodoxa foi substituída por uma mistura de crenças, variável e muitas vezes contraditória, que se adapta melhor ao estilo de vida ocidental, não incomoda os crentes no dia-a-dia e sobretudo não impõe a mais leve proibição ao que eles querem pensar ou fazer. Um católico pode hoje, por exemplo, aprovar os contraceptivos, como pode ser a favor da homossexualidade e do casamento homossexual, sem qualquer dor ou distúrbio de consciência. Nestas matérias, o Vaticano passa por uma instituição obsoleta e anquilosada, cuja intransigência se não deve levar muito a sério.

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O Papa Bento XVI, um velho professor de Teologia Dogmática, insistiu em relembrar os fundamentos da doutrina e em reconstituir, na medida do possível, uma tradição ignorada e, agora, crescentemente desprezada. Não chegou longe, impedido pela indiferença geral e pela resistência interna e externa, que pouco a pouco o isolou. Quando saiu, o seu pontificado estava sem destino. O Papa Francisco resolveu seguir outro caminho. Sendo - como o seu nome indica - um franciscano, pensa manifestamente em reconstruir a Igreja de baixo para cima. Daí a insistência na humildade, no amor à Criação, na fraternidade humana e na pobreza relativa a que ele mesmo conseguiu chegar: não aceitou os sapatos da convenção, recusou o apartamento (suponho que magnífico) que era o dos papas desde o princípio do século XX e escolheu para ele uma hospedaria de padres num canto do Vaticano.

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Outros gestos como estes não tardarão a vir com o propósito transparente de surpreender e mobilizar o "povo de Deus". O franciscanismo foi na sua origem um movimento popular, que pretendia reconduzir a Igreja à sua pureza primitiva. Este Papa também não se interessa muito por batalhas teológicas, o que lhe interessa é reconquistar as massas, perdidas no ateísmo e na heresia, para o catolicismo: e a sua vocação para o espectáculo irá com certeza mudar a face da Igreja. Mas sem nenhuma concessão no essencial. O Papa Francisco acredita no Diabo e acredita que o Diabo está por detrás das desordens de que os verdadeiros crentes sofreram a partir de Pio XII. E, além disso, o Pai da Mentira é um inimigo familiar.

30 Mar, 2013

VALE TUDO

Vasco Pulido Valente - Público de 30-3-2013

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De repente, os políticos resolveram emigrar para a televisão às manadas. Pior ainda: não se trata de um ou outro obscuro deputado ou de um secretário despedido por inépcia ou conveniência. Os políticos que hoje "comentam" e "debatem" o que se passa, ou não passa, no país são quase todos personagens de grande importância ou de grande estatuto. Vejam só: Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa, António Lobo Xavier, José Pacheco Pereira, Manuela Ferreira Leite, Francisco Assis, Pedro Santana Lopes, Marques Mendes, Bagão Félix, Jorge Coelho, Francisco Louçã, Augusto Santos Silva, Miguel Beleza, Morais Sarmento e até, calculem, o retornado Sócrates. Só este grupinho chegava e sobrava para fazer sem esforço um governo ou dois e, no entanto, eles perdem o seu tempo pontificando nas dezenas de canais que por aí aparecem.

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Mas não há mistério no caso. As televisões querem caras conhecidas, com algum prestígio, um aspecto agradável, uma voz simpática e um certo desembaraço a falar. Ora precisamente os políticos que "subiram" acabaram sempre por subir à custa dessas qualidades, em que se educaram e treinaram durante anos. Não custa por isso compreender a transferência. Na televisão, de resto, ganham muito mais do que na Assembleia da República ou num cargo oficial modesto; não têm qualquer espécie de responsabilidades; e com a popularidade que vão ganhando, estão em óptima posição para aproveitar as desgraças do governo. O negócio convém às duas partes. Para as televisões, audiências maiores trazem mais dinheiro. Para os políticos, nada substitui a campanha eleitoral permanente do "comentário". (...)

Alberto Gonçalves - DN de 24-3-2013

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Para início de conversa, esclareço que, na minha opinião, uma lei ideal limitaria os mandatos autárquicos a cerca de uma semana, período a partir do qual os senhores autarcas começam a definir a rede de interesses que servirão. Também defendo que a lei deveria impedir as candidaturas dos vereadores, chefes de gabinete, secretários, assessores, compinchas, conhecidos e primos até terceiro grau do autarca cessante. Por fim, acho que a lei faria bem em limitar em quantidade as próprias autarquias, pormenor que aliás parecia constar do "memorando" assinado com a troika e que o Governo varreu airosamente para debaixo do tapete.

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Quanto à lei que temos, é uma vergonha em matéria de clareza jurídica e um portento de matéria de clareza política. O PSD, que apresenta a votos diversos veteranos de outras freguesias (ou câmaras, para ser exacto), entende que a limitação incide nos municípios e não nas funções. O Bloco, que praticamente não é para aqui chamado, entende que a limitação incide nos municípios e nas funções. O PCP, que tenciona mudar dois ou três caciques alentejanos, entende que a limitação incide nos municípios e não nas funções. O CDS, uma fortaleza de convicção, entende que a limitação incide nos municípios e nas funções, excepto no caso de Lisboa. E o PS, que não viu interesse estratégico na transladação de candidatos, finge que o assunto não lhe diz respeito e pretende passar por exemplo ético.

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Eis o perfeito retrato dos princípios que fundamenta o sistema partidário: com a lógica natural numa empresa, cada partido faz os cálculos, antecipa perdas e ganhos e decide de acordo com o respectivo interesse imediato, vendido aos simples sob o rótulo de "interesse nacional" e não, surpreendentemente, de Relatório & Contas. Resta apurar o número de simples que ainda engolem a patranha e confiam apaixonadamente nos partidos como nunca confiariam numa empresa. As eleições autárquicas serão um óptimo indicador e, suspeito, o péssimo sinal do costume.

30 Mar, 2013

A NUVEM POR JUNO

Pedro Marques Lopes - DN de 24-3-2013

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Não há cidadão minimamente interessado na coisa pública que não esteja preocupado com a saúde do nosso sistema político. Só alguém muito distraído ou desinteressado pode ignorar que os principais partidos estão reféns de caciques sem ideologia ou pensamento político e que parte importante dos candidatos a cargos políticos são escolhidos não em função das suas qualidades mas da cega fidelidade a quem manda no partido.

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Não é difícil prever que os partidos não se auto-regenerarão. Talvez o pessimismo dos tempos me tenha também afectado, mas não acredito que o monstro abdique do seu próprio poder. Ou então trocará um bocadinho por ainda mais. É nisso que as máquinas partidárias se transformaram: pensam só e apenas no poder.

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Também poucos desconhecerão a cada vez menor capacidade da vida política atrair os melhores e os mais capazes de nós.

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As razões são muitas, desde logo o bloqueio que as máquinas partidárias realizam actuando como filtro: estando dominadas por medíocres, dificilmente deixam não medíocres crescer dentro da estrutura. (...)

29 Mar, 2013

SÓCRATES

Santana-Maia Leonardo - A Barca

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Tendo em conta que somos um povo avesso a ler e a pensar e, consequentemente, com um elevado grau de iliteracia (70% segundo números recentes), não me espanta rigorosamente nada haver um grande número de portugueses, com direito a voto, disposto a entregar todas as suas economias ao primeiro desconhecido que lá lhe apareça em casa intitulando-se funcionário da Segurança Social. Com efeito, a ignorância cultivada e a nossa inata ingenuidade levam-nos a cair facilmente no conto do vigário.

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Agora o que já me espanta é haver um número muito significativo de portugueses que é capaz de voltar a cair na cantiga do bandido se o mesmo individuo lá for bater à sua porta com a mesma conversa. Neste caso, só mesmo a estupidez natural consegue explicar a reincidência. Mas, pelos vistos, ainda há muitos portugueses apostados em comprovar a tese de Einstein de que a estupidez humana é infinita.

Vasco Puliddo Valente - Público de 29-3-2013

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Com o arzinho de vítima e o arzinho de brutalidade, que os portugueses conhecem, Sócrates foi anteontem à televisão. Veio muito pior de Paris: sem escrúpulos de inventar o que lhe convém e com um autoritarismo e um azedume que roçam o patológico. Tratou os jornalistas que o entrevistaram com a maior má-criação e às 140.000 pessoas que o criticaram ou não o apoiaram na Internet chamou "essa gente", com aberto desprezo e, pior do que isso, com a ameaça velada de quem tenciona, tarde ou cedo, ajustar contas. Parece que se convenceu que depois do pequeno incidente de 2011 vinha outra vez tomar conta do país e que ninguém se atreveria a protestar. Só precisava de contar uma história, a verdadeira história, dos seus padecimento e martírio, para que Portugal inteiro caísse aos pés dele em adoração e penitência.

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E que história é essa? Primeiro, que ele governou justa e gloriosamente até 2007. Segundo, que a nossa desgraçada dívida não passa de um efeito inevitável da crise internacional de 2007/8. Terceiro, que se o PSD tivesse aceitado o PEC IV em 2011, não seria preciso qualquer resgate e, logicamente, ninguém se lembraria de mandar para cá a odiosa troika. Quarto, ele, Sócrates, lutara sempre contra o resgate e a troika e hoje ninguém o pode responsabilizar directa ou indirectamente pelo assunto. De resto, e tirando a perniciosa influência do estrangeiro, a política financeira do Governo dele é um exemplo de prudência, de rigor e de inovação. Como também a política económica, que hoje em parte pagamos pelo triplo do preço que ela realmente custou. Mas Sócrates não se interessa por pormenores.

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O que lhe interessa é deixar bem à vista os miseráveis culpados da sua queda e, com ela, a de Portugal. De Pedro Passos Coelho e o PSD quase nem vale a pena falar: queriam o poder mesmo à custa da nossa miséria e votaram o PEC IV por puros motivos partidários. Sozinhos talvez não conseguissem lá chegar. Mas por detrás deles estava a mão do "desleal" Cavaco, que lhes preparou o caminho e empurrou para a frente no momento certo. Cavaco era (e continua a ser) o guia e o chefe, o PSD e o CDS os fantoches que ele usou para os seus próprios fins (que fins, Sócrates não explica). De qualquer maneira, segundo esta versão da história, a direita é o mal e a esquerda é o bem; Cavaco é um enviado das trevas e Sócrates (agora regressado do exílio, limpo de pecado) é o anjo vingador. Se os portugueses que assistiram à entrevista da criatura acreditaram nela, Deus nos salve e depressa.

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