Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

COLUNA VERTICAL

"A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras.." (Aristóteles)

COLUNA VERTICAL

"A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras.." (Aristóteles)

29 Ago, 2014

Contra os pobres

Miguel Esteves Cardoso - Público de 26-8-2014

É repugnante odiar os pobres por não estarem sempre a sofrer mas é cada vez mais frequente ouvir-se que o não-sei-quantos vai buscar comida à igreja mas depois vai beber uma imperial na praia.

Uma das mais velhas anedotas judias é a do schnorrer (crava esperto) que vai pedir um empréstimo de 25 florins a um ricaço que, logo depois, dá com o devedor a atacar uma bela maionaise de salmão. O ricaço indigna-se e o pobre inteligente responde que não percebe: se não tem dinheiro, não pode comer maionaise de salmão. Se tem dinheiro, também não pode comer maionaise de salmão. Pergunta de seguida, com tanto desespero como lógica: "Quando então é que posso comer maionaise de salmão"?

É a mesma irracionalidade desempática que leva as pessoas a dar esmolas condicionadas: dão comida mas recusam-se a pagar não só heroína e vinho como - juro que já são mais de mil vezes que testemunhei - bolos e gelados.

A caridade que por aí anda parece-se mais com compras e consumismo: dá-se dinheiro para obter o prazer dos resultados que se desejam. Quase nunca se dá a única coisa boa que se pode dar: a liberdade de gastar o dinheiro como se quer, que é um direito de que ninguém com um mínimo de dinheiro prescinde.

Mandar nos outros (ou, pior ainda, querer mandar nos outros) é uma barata sobranceria. Os pobres precisam apenas de duas coisas: de dinheiro e de liberdade. E só precisam da segunda coisa se a primeira não for suficiente.

Que nunca, nunca é. Quando será? 

Santana-Maia Leonardo - Público de 17-8-2014

Nasci no dia 5 de Outubro, numa família republicana. A causa monárquica sempre me pareceu uma coisa tão deslocada no tempo que nunca questionei a natureza republicana do regime. Até hoje. Com efeito, ocorreram dois acontecimentos este ano que me fizeram mudar radicalmente de ideias: um externo (a sucessão de D. Juan Carlos) e outro interno (a reforma do mapa judiciário).

Com a sucessão de D. Juan Carlos, percebi uma coisa que, nesse momento, se tornou óbvia para mim, tendo em conta o fervilhar dos nacionalismos: que apenas o Rei era capaz de garantir a unidade do Estado espanhol. Por sua vez, com a reforma do mapa judiciário, percebi que, à medida que os votos se vão amontando na reduzida faixa litoral Lisboa - Porto, a República vai-se confinando paulatinamente a esse território. Ou seja, enquanto a monarquia tem o condão de esticar o território, a República encolhe-o.

O Rei, ao contrário do Presidente da República, é uma instituição que, por via da sucessão hereditária, transporta consigo todo o património histórico e cultural do reino. E, nessa medida, resiste muito melhor às pulsões das modas e do tempo presente, sempre efémero e circunstancial, do que um Presidente da República que, para ser eleito, tem de ser da cor da moda e andar a reboque das maiorias. Por alguma razão, o Rei é de Portugal e o Presidente é da República.

Nas monarquias parlamentares, até o povo tem mais facilidade em distinguir o essencial do circunstancial. O essencial, que tem a ver com a independência nacional, a soberania e a unidade do estado, tem por referência a figura do Rei; o circunstancial, que tem a ver com a governação do país em cada momento, depende inteiramente do Parlamento eleito.

Neste momento, por via da concentração dos votos na região de Lisboa, a República deixou de ser portuguesa e passou a ser lisboeta. E a elite política que nos governa e que se vai amontoando em Lisboa é incapaz de abrir mão do que quer que seja com vista a equilibrar e repovoar o território. O mais que se lhes consegue arrancar é meia-dúzia de frases feitas, que reproduzem sempre nos discursos de circunstância, e uns putativos incentivos à fixação de algumas empresas no interior, incentivos esses a que se candidatam apenas as empresas que, por natureza, não podem ficar no litoral.

Ora, como todos sabemos, num país com a nossa configuração, em que a costa litoral é o que tem maior valor económico e o mais apelativo do ponto de vista empresarial, o interior só pode ser repovoado através da deslocação de serviços de Lisboa para o interior, designadamente, da universidade pública, dos quartéis da tropa, de grandes hospitais, de Tribunais, de Direcções Gerais, de Ministérios, etc.. Tanto mais que Lisboa é uma zona sísmica pelo que não é prudente que tudo isto aí se amontoe.

No entanto, o processo é precisamente o inverso. Ao mesmo tempo que fala em investir no interior, o Governo vai varrendo, literalmente, as pessoas do interior para o litoral com o encerramento de escolas, tribunais, centros de saúde, etc.

Antes que seja demasiado tarde, Alentejo, Beira Interior e Trás-os-Montes deviam unir-se e formar um grande movimento com vista a resistir ao poder político de Lisboa, sob pena de, muito em breve, quer por força das políticas dos governos, quer por força da quebra de natalidade que vai ter especial impacto nestas regiões, assistirem à morte das suas aldeias, vilas e cidades. É a HORA!

Mário Lopes - Público de 16-8-2014

Numerosas decisões de política económica do Governo têm sido declaradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional (TC). Em geral são decisões que visam reduzir a despesa pública por via de cortes em salários, pensões, etc., em particular dos funcionários públicos. Os acórdãos do TC que fundamentam estas decisões são indecifráveis pelo cidadão comum, mas sabe-se serem baseados na interpretação que os juízes do TC fazem de princípios inscritos na Constituição. (...)

De facto muitas destas decisões sobre aplicação de princípios tão gerais como a igualdade ou a confiança, tanto podem ser invocados para justificar certas decisões como as contrárias, pois o que está em causa não são os princípios, mas interpretações subjectivas sobre a sua aplicação. Esta subjectividade também faz com que os próprios juízes tenham diferentes opiniões sobre os mesmos assuntos, o que se tem reflectido no resultado de votações por 7 a 6. Matérias deste tipo deviam ser objecto de decisão política de representantes eleitos e não de juízes não eleitos. (...)

Se o TC continuar a forçar a continuação do ajustamento económico por via do aumento da carga fiscal, caminhamos para uma situação insustentável que tornará a bancarrota inevitável. E tudo isto com base em decisões baseadas em interpretações subjectivas, e portanto políticas, de princípios gerais, por um órgão não eleito e a que portanto não devia ser atribuída legitimidade para o fazer. Por que razão o povo português não pode ter a opção de evitar a bancarrota e todo o sofrimento que isso acarreta? Não se trata de gostar ou não, politicamente, das decisões subjectivas do TC, trata-se de saber se deve ser o TC ou o povo português a tomar essas decisões. Devemos por isso questionar-nos sobre as responsabilidades do TC, se estas não se deveriam restringir à aplicação de normas constitucionais objectivas, ou seja, um trabalho técnico, e não incluir a interpretação, política, de princípios gerais, deixando à política o que é da política. (...)

No preâmbulo da Constituição está escrito “A Assembleia Constituinte afirma a decisão do povo português … de abrir caminho para uma sociedade socialista”. Então e se a decisão do povo português, expressa em eleições livres for no sentido de uma sociedade não socialista? A vontade do povo será inconstitucional, ou seja, a própria democracia é inconstitucional. (...)

Estes absurdos deveriam ser corrigidos numa futura revisão constitucional por todos aqueles que acham que a vontade do povo deve ser respeitada e que a Constituição e o TC devem servir a democracia e não o contrário. Obviamente haverá oposição daqueles que tentarão continuar a usar a Constituição para conseguir aquilo que não conseguem em eleições livres.

Público de 24-8-2014

Um grupo de 30 personalidades, entre os quais o deputado do CDS-PP Ribeiro e Castro ou o ex-ministro das Finanças Campos e Cunha, pede uma reforma urgente do sistema eleitoral e mais transparência no financiamento dos partidos.

As propostas vão surgir em forma de manifesto assinado por 30 “personalidades independentes” com ligações políticas tanto ao PS, como ao PSD ou CDS, onde pedem “reformas imediatas do sistema político”, a tempo de iniciar um novo ciclo a partir de 2015.

O deputado e ex-líder do CDS-PP José Ribeiro e Castro, um dos signatários do manifesto, explicou que se trata de um grupo de pessoas que já desde há muito tempo se dedica ao debate de temas da actualidade, e que consideram que “o bloqueio fundamental está no sistema político”.

O texto do manifesto já está terminado e o documento dá pelo nome de “Por uma Democracia de Qualidade”, onde são propostas duas reformas “prioritárias” do sistema político, uma relativamente ao sistema eleitoral e outra sobre o financiamento dos partidos.

Sobre o primeiro ponto, Ribeiro e Castro lembrou que a reforma eleitoral é possível desde há 17 anos e que o desejo é que sejam dados mais poderes aos eleitores e aproximar os deputados eleitos dos cidadãos.

É o atraso dessa reforma que contribui para um certo atoleiro, um certo pântano em que se tem vindo a viver e um descontentamento crescente da cidadania”, apontou, acrescentando que se trata de uma reforma “prioritária”, “possível” e que convinha ser feita antes do ciclo político que se inicia em 2015.

Na parte do documento a que a Lusa teve acesso, os signatários inclinam-se para “um modelo de conjugação entre a eleição dos deputados em listas plurinominais e a introdução de uma componente de círculos uninominais”, que “garanta sempre a proporcionalidade justa e impecável da representação parlamentar”.

Apontando o momento de “crise profundíssima” que o país atravessa e fazendo referência à crise no Banco Espirito Santo, Ribeiro e Castro adiantou que os vários signatários defendem a necessidade da reforma face aos “efeitos de desmoralização profundíssima na sociedade portuguesa”.

Num segundo momento, em relação ao financiamento dos partidos, Ribeiro e Castro frisou que há “sensibilidades diferentes” por parte dos vários signatários, mas destacou que o que todos pretendem é que haja “um grito de alerta e um chamamento à responsabilidade dos partidos políticos”.

Segundo o deputado do CDS, todos concordam com as características do sistema actual, de financiamento público maioritário e de financiamento privado limitado, “só que há indícios de que o sistema não está a atingir os seus propósitos”.

Defendem que as contas dos partidos sejam auditadas por entidades independentes e credíveis, nomeadamente um “corpo de auditores especiais no âmbito da Procuradoria-Geral da República, uma secção especializada do Tribunal de Contas e o recurso necessário a auditores externos”.

O documento integral deverá ser apresentado no próximo dia 27, estando prevista uma reunião entre todos os subscritores no dia 9 de Setembro.

Entre as pessoas que subscrevem o manifesto estão Henrique Neto, Luís Mira Amaral, Luís Campos e Cunha, Fernando Teixeira Mendes, José António Girão, Clemente Pedro Nunes, António Pinho Cardão, Luís Filipe Pereira e João Luís Mota Campos.

João Miguel Tavares - Público de 26-8-2014

Em entrevista ao Expresso, António Costa afirmou que o seu verdadeiro adversário era Rui Rio. (...) É um erro crasso: José Sócrates já preencheu a quota do socialista arrogante para as próximas três gerações. Ninguém quer ver isso de novo em António Costa. E, no entanto, aquela frase desastrada é um triplo salto de arrogância. (...) Dizer que Rui Rio é o seu verdadeiro adversário é um desrespeito pelos eleitores do PS, um desrespeito pelos eleitores do PSD e, em última análise, um desrespeito pelo próprio processo democrático. (...)

Numa outra entrevista, desta vez à revista Visão, afirmou, com certa candura: “Estas primárias resultam de um truque para tentar desgastar-me”. Sem dúvida que resultam, mas as primárias só estão a desgastar António Costa porque ele está a ser obrigado a falar, e ao falar nada tem para dizer. As pessoas que por ele têm consideração intelectual, como é o meu caso, acham que ele não diz porque não quer. Só que isso ainda é pior do que não dizer porque não sabe. António Costa está convencido que consegue chegar a primeiro-ministro em 2015 apostando numa bateria de generalidades tipo “agenda para a década”, que espremidas dão coisa absolutamente nenhuma. Não há ali um pingo de novidade e as suas intenções piedosas já foram prometidas vezes sem conta por resmas de políticos, da direita à esquerda (qualificação, inovação, crescimento, coesão, nova estratégia europeia, blá, blá, blá). Sobre as malditas finanças públicas, nem uma palavra concreta. Claro que, diz Costa, é um problema que não se pode “desvalorizar”. Mas só em teoria. Na prática é desvalorizadíssimo, porque não há uma medida estrutural que a sua campanha apresente do lado da despesa.

Nesse sentido, afirmar que Rui Rio é o seu verdadeiro adversário político é apenas mais um degrau da estratégia cheque em branco: apresentem-me alguém que esteja à minha altura que depois a gente conversa. Só que se ele for com esta táctica para os debates com Seguro, talvez ganhe o PS, mas pode dizer adeus à esperança de uma maioria absoluta. O eleitorado flutuante já não passa cheques em branco a ninguém. Todos queremos uma resposta para o nosso presente. Gente que só fala do futuro é coisa do passado.