André Azevedo Alves - Observador de 30-8-2014
Tal como um zombie, a lamentável Lei da Cópia Privada reaparece de tempos a tempos, sempre com o intuito de alargar o âmbito de extorsão de recursos aos consumidores e contribuintes portugueses. O essencial sobre a Lei da Cópia Privada pode ser lido neste Explicador do Observador e neste texto de Maria João Nogueira, pelo que pouparei os leitores a uma discussão dos traços gerais da referida lei. (...)
A Lei da Cópia Privada, recorde-se, não está relacionada com a pirataria (que continua a ser ilegal), mas sim com a cópia de obras legalmente adquiridas. Além de actualizar os valores de taxas existentes (e igualmente injustificadas), a nova lei visa alargar, por assim dizer, a “base de tributação”. Assim, a ideia é que todos os aparelhos eletrónicos com capacidade para gravar dados passem a ser taxados. Aparelhos como tablets, memórias USB, cartões de memória e – a cereja no topo do bolo – telemóveis passarão a ser taxados em função das respectivas capacidades de armazenamento. A justificação – se é que merece esse nome – é que esses dispositivos poderão, eventualmente, ser utilizados pelos detentores para efectuar cópias privadas legais, as quais, (de forma estranhamente presumida mas não demonstrada) supostamente, prejudicam os autores de conteúdos.
Caso a nova lei venha a ser implementada, os consumidores pagarão substancialmente mais para adquirir uma vasta gama de aparelhos electrónicos. Os produtores e distribuidores desses produtos perderão vendas e receitas. O Estado perderá a receita associada à actividade económica destruída pelas novas taxas. A sociedade como um todo ficará mais pobre pelas ineficiências económicas artificialmente introduzidas pela lei.
Quem ganha ou, por outras palavras, qual é neste caso o grupo de pressão pequeno, organizado e politicamente influente? Muitos críticos da lei têm referido os “artistas”, mas essa é uma descrição incorrecta da situação. Os principais e directos beneficiários da nova lei são a AGECOP (Associação para a Gestão da Cópia Privada) e as entidades associadas, como a SPA, que recolhem e absorvem nas suas estruturas burocráticas uma parte substancial das receitas resultantes da renda. Num segundo plano, ganham também as clientelas que gravitam em torno dessas entidades e junto das quais parte dos recursos são “aplicados”. Por último, os recursos que sobrarem serão distribuídos por alguns autores, mas apenas aqueles devidamente registados e representados (com os custos associados) por entidades gestoras de direitos de autor. (...)
Tendo em conta os benefícios concentrados num grupo de pressão pequeno e poderoso, a dispersão de custos pelos consumidores e, em especial, o contexto eleitoral que se avizinha e a pouca vontade governamental para enfrentar interesses instalados, é bem possível que desta vez a abominável Lei da Cópia Privada não seja travada pela sociedade civil. Ficará, mais uma vez, a perder o país.