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COLUNA VERTICAL

"A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras.." (Aristóteles)

COLUNA VERTICAL

"A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras.." (Aristóteles)

A frase é de Óscar Wilde (A educação é uma coisa admirável, mas é bom recordar que nada do que vale a pena saber pode ser ensinado.”) e a foto é da autoria de Maria Isabel Clara.

As fotos da coluna lateral são natalícias da autoria de: K. Chae (Lisboa), Luís Almeida (Porto) e Manuel Barata (Serra da Estrela). 

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Francisco Teixeira da Mota - Público de 27-12-2014

(...) Se a ministra revelou bom senso no que toca à indicação da nova Procuradora-geral, tem que se dizer que a sua gestão do processo da reforma judiciária no aspecto da plataforma informática Citius - para além dos atrasos no funcionamento dos tribunais que provocou e se hão-de sentir ao longo de muito tempo - se revelou  de uma incompetência que provoca perplexidade.

Como foi possível dispensar a consultora externa nesta fase crucial? Como foi possível avançar para uma monstruosa migração de processos sem se estar certo de que tudo iria bem? Quem falhou neste processo? Como foi possível a ministra ter estado tanto tempo de olhos vendados quanto à realidade do que se estava a passar?

Certo é que a canhestra e mal sucedida tentativa de responsabilizar dois responsáveis menores e o facto de nem uma orelha, quanto mais uma cabeça, ter rolado, nos transmite a ideia que no ministério da Justiça, o tempo da impunidade e da irresponsabilidade não acabaram, antes continuam de vento em popa.

Quanto à reforma judiciária propriamente dita, ainda é cedo para avaliar das suas reais vantagens e desvantagens. Se é certo que havia tribunais cuja manutenção não fazia sentido e que a criação de diversos tribunais especializados espalhados por todo o país  faz todo o sentido,  a verdade é que está por provar que iremos ter uma justiça melhor e mais eficaz com esta nova organização judiciária. Sendo certo  que não se encontram quantificados os custos para as populações desta reforma e que serão, seguramente, elevados. Há, na verdade, que aguardar pelas prometidas avaliações da reforma que se confia, serão sérias. (...)

Helena Matos - Observador de 28-12-2014

A imagem não é minha mas sim de Raquel Varela que referindo-se a Passos Coelho o viu “com o seu fato de alfaiate de segunda, morador suburbano”. Por sinal acho que Raquel Varela tem razão. Só que, como é próprio da extrema-esquerda, Raquel Varela não percebeu a razão da razão que tinha.

De facto Passos Coelho não só vive nos subúrbios como os seus fatos são semelhantes a milhares de outros que os habitantes dos subúrbios vestem durante os dias de semana. Ora aquilo a que se assiste neste momento entre os protagonistas da política em Portugal é também uma clivagem social e geracional. Uma clivagem transversal ao espectro político e em que os subúrbios e os fatos de segunda não serão irrelevantes. (...)

O que vivemos neste momento é um desacerto entre o mundo mediático e uma parte das elites dos partidos. Não interessa se se gosta ou detesta. Interessa apenas que é assim. Da extrema-esquerda ao CDS as nomenclaturas falam, agem e imaginam-se num Portugal em que eles, urbanos e cultos, pairam sob um povo de forte pendor rural. É o país dos muito pobres e dos muitos ricos, dos privilegiados e dos sem-abrigo. O país no qual eles, os políticos, se veem a corrigir os desequilíbrios e as injustiças e a mudar a realidade à força de decretos-lei.

Só que esse país, por mais fotogénico que fosse, e de facto era e ainda é nas reportagens paternalistas que o New York Times nos dedica, coexiste com um Portugal suburbano, cheio de homens que vestem fatos de alfaiates de segunda para ir trabalhar. Alguns optam por uma ainda mais esteticamente dramática versão desportiva. As élites partidárias, culturais e mediáticas abominam este mundo que não fica bem nas fotografias, não aparece muito nas encíclicas e não encontra explicação em Marx. Das universidades onde se multiplicam os centros de estudos dirigidos por clones de Raquel Varela às sedes partidárias sejam elas de esquerda ou de direita, a dicotomia entre os muito pobres e os muito ricos justifica-lhes muito mais o seu pendor intervencionista.

Mas o país suburbano existe e é fundamental que os grandes partidos e os seus líderes democratizem a relação que têm com ele. Caso não o façam o desinteresse dessas pessoas será um dos terrenos em que crescerão os populismos que tornarão o país ingovernável. Os casos da França e da Espanha são um bom exemplo daquilo a que pode conduzir a clivagem entre os partidos democráticos e a realidade. Só que em Portugal não será sequer necessário que surjam uma Frente Nacional ou um Podemos para que acabemos num beco sem saída ou mais propriamente a acreditar que é possível regressar ao passado. PS e PSD têm mais do que quanto baste de gente que acredita que tal não só é possível como desejável.

Alexandre Homem Cristo - Observador de 29-12-2014

Tem qualquer coisa de hipócrita esta nossa obsessão em limar os defeitos de heróis da nossa juventude, ou aperfeiçoar as suas histórias e aventuras, para que tudo esteja adequado ao consumo dos tempos modernos. (...) 

Basta uma breve pesquisa pela internet para constatar que, ao longo dos anos, têm sido dezenas as alterações às histórias de banda desenhada e aos filmes infantis, variando consoante o país onde são publicadas. O Lucky Luke deixou de fumar, trocando o cigarro na boca por uma palha. Os irmãos Dalton, os seus eternos inimigos, nunca mais foram alvejados pelos tiros dos revólveres. (...) O Tio Patinhas viu a sua aventura na América banida porque os índios eram demasiado semelhantes entre si (o que foi visto como uma forma de racismo). E o Capitão Haddock, veterano marinheiro, alcoólico temperamental e parceiro de aventuras de Tintim, deixou de beber.

Ora, este tipo de censura dificilmente poderia ser mais hipócrita, na medida em que não é feito a pensar nos mais jovens. É feito para satisfazer (e impor) os nossos preconceitos de adultos. (...)

Este tipo de censura é para nós, adultos, que vivemos obcecados com o politicamente correcto e que identificamos em qualquer pequena característica pessoal ou social a promoção de vícios morais – racismo, violência, alcoolismo. Daí esta tentação justiceira de reescrever tudo o que está escrito, tornando-o aceitável aos nossos padrões modernos: o vilão tem de ser branco, porque se fosse negro era racismo; o herói não pode beber nem fumar, porque isso é dar um mau exemplo; as minorias étnicas têm de ter bom ar, porque senão é xenofobia. (...)

Surpreendente mesmo é o critério: quem vê problema nos cigarros do Lucky Luke não o vê na Miley Cyrus (que tem milhões de adolescentes a seguir os seus passos) a cantar nua enquanto lambe bolas de metal.

Entre tanta hipocrisia, a maior de todas é esta: achar-se que isto é o reflexo de uma sociedade mais tolerante. Pelo contrário: a obsessão pela tolerância (sob a máscara do politicamente correcto) tornou, em muitos aspectos, a nossa sociedade mais intolerante. O Capitão Haddock que o diga.

José Manuel Fernandes - Observador de 28-12-2014

Toda vida me considerei um idealista – mas o passar dos anos tem feito de mim alguém muito mais céptico. Só espero não acabar cínico, ficando apenas pelo realismo. É que não têm faltado motivos para desesperar dos “grandes sonhos” e dos “grandes desígnios”.

Comecemos por Portugal. Estamos presos numa armadilha que se chama euro. Sem ele teríamos sido ainda mais periféricos do que somos, com ele ficámos presos a regras que limitam a nossa autodeterminação. Se o abandonarmos, o mínimo que enfrentaremos será uma crise que fará parecer coisa de crianças a que acabámos de viver; se não o abandonarmos, viveremos numa espécie de purgatório sem fim à vista. As escolhas políticas e económicas são cada vez mais entre o mal maior e mal menor, sendo que uma parte do país até já acha que a pedinchice é o nosso mais nobre destino – tudo depende, dizem, de nos juntarmos a uma boa e reivindicativa coligação de pedintes. (...)

Nunca o sonho europeu, alimentado por tantos meritórios idealismos e disparatadas utopias, esteve tão perto do pesadelo. Por todo o lado o nacionalismo zangado está tornar-se o refúgio da desilusão e do desencanto. O populismo ocupou o lugar da racionalidade e do compromisso.

O problema não é das lideranças e da falta de supostos “homens de Estado” visionários – o problema é do legado irrealista que os visionários nos deixaram. 

Se saltarmos da Europa para mundo, vivemos um momento quase perfeito de desilusão idealista. (...)

Sem uma potência hegemónica, sem o odiado “grande satã” (ou com este encolhido e temeroso, como é a América de Obama), de repente a desordem aumentou, a infelicidade e a insegurança aumentaram, o número de refugiados nunca foi tão grande, os sonhos nunca foram tão ausentes, as Nações Unidas nunca foram tão inúteis. Basta pensar nessa maior de todas as ilusões que foi a “primavera árabe”.

Recuperemos pois algum realismo para evitarmos a submissão total ao cinismo – ou, então, a impotência quase criminosa dos idealismos bem-pensantes, dessa trupe que vai dos pacifistas aos multilateralistas.

Em Portugal não há volta a dar: temos de procurar viver com os nossos próprios meios, adaptarmos o nosso sistema económico e político a uma era que vai ser de menos expectativas e mais esforço. Pedirmos a outros para resolverem os nossos problemas (e as nossas dívidas) não é solução, antes pode tornar ainda mais difícil a outra solução, a europeia, pois essa terá de permitir alguma renacionalização de políticas. (...)

Santana-Maia Leonardo - Diário As Beiras de 17-12-2014

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O futebol português é o espelho da nossa realidade política. E não deixa de ser engraçado ver os nossos comentadores políticos procurarem dar alguma racionalidade ao comportamento do eleitorado português quando ele se move exclusivamente por razões clubísticas. Acreditar que o caso Sócrates é capaz de retirar algum voto ao Partido Socialista é o mesmo que acreditar que o Porto ou o Benfica perderam adeptos por causa do Apito Dourado ou da prisão de Vale e Azevedo.

Analisemos o caso recente de Miguel Rosa e Deyverson que foram impedidos de defrontar o Benfica pelo presidente do Belenenses, em virtude de um acordo de cavalheiros entre os dois clubes. É óbvio que se trata de uma violação grosseira dos regulamentos que considera nulas todas as cláusulas deste tipo insertas em contratos de cedência de jogadores. Se vivêssemos num país decente, os clubes seriam penalizados e não seriam admitidos sequer aquele tipo de argumentos à portuguesa a fazer dos outros parvos.

Mas, em Portugal, sempre que acontece uma violação descarada da lei por parte de um grande, a reacção nunca é punir o grande mas invocar a pouca clareza da lei e, de imediato, propor uma alteração legislativa para que isso não volte a suceder. Desta forma, matam-se dois coelhos de uma cajadada: por um lado, não se pune quem se devia punir e, por outra, atira-se a culpa para cima da lei. Infelizmente, em Portugal, a lei só está bem redigida para os pequenos porque, para os grandes, está sempre mal redigida, independentemente das vezes que seja aperfeiçoada.

Mas existe um dado na argumentação do presidente do Belenenses, que tem sido sufragado por muitos comentadores, que revela muito da forma como o povo português entende o profissionalismo e a deontologia profissional. Segundo o presidente do Belenenses, os dois jogadores foram impedidos de jogar para os proteger pelo facto de terem uma ligação ainda que remota ao Benfica, o que poderia influenciar negativamente o seu desempenho. Ou seja, aceitando este argumento, por maioria de razão se deveria impedir adeptos do Benfica de arbitrarem, participarem em decisões do Conselho de Arbitragem, de Disciplina ou outro em que estivessem em jogo interesses do Benfica. E, tendo em conta que 47% dos adeptos portugueses são do Benfica, o melhor será considerar-se que a Liga portuguesa não tem condições para realizar jogos com um mínimo de seriedade porque haverá sempre adeptos do Benfica nas equipas contrárias, inclusive na direcção.

Este tipo de suspeição e de argumentação é típica de povos corruptos que não acreditam que a ética e o rigor profissional se possam sobrepor ao amiguismo e aos interesses de grupo.

Manuel Carvalho - Público de 28-12-2014

Há crimes arquivados que não salvam os suspeitos de condenações políticas e Paulo Portas sabe disso melhor do que ninguém. O que ele faria nos tempos de O Independente se lhe chegasse às mãos um despacho como o que engavetou o nebuloso processo dos submarinos, não é difícil de imaginar. Mas como desta vez é ele quem está no centro do furacão por ser responsável, no papel de ministro da Defesa, por “ilegalidades administrativas”, por negociações “opacas”, pela “celebração de um contrato substancialmente diverso do adjudicado pelo Conselho de Ministros” ou por ter participado na introdução de uma contrapartida de valor “muitíssimo significativo” que “nem sequer foi objecto de qualquer relatório de avaliação”, é muito provável que assobie para o lado. O estrondo do texto dos procuradores, porém, é irrevogável e não se silencia com um simples sopro de ar. (...)

Se o país está a mudar como muita boa gente acredita, deixará de haver lugar para zonas cinzentas como as que Portas protagonizou nos submarinos. A condescendência perante anos e anos de abusos de poder, de contratos lesivos para o Estado e de negociatas rendosas para os bolsos de alguns ou para os cofres dos partidos, acabou. O nojo colectivo com o BES ou o estado de alarme causado pela detenção de José Sócrates certificaram na opinião pública a existência de um pântano moral que cresceu com o dinheiro fácil da Europa e com o despesismo do Estado. (...)

Mesmo aplicando todas as margens de segurança que se exigem a um julgamento na opinião pública, a crueza dos factos é demasiado evidente para que Portas seja merecedor do grau de confiança que qualquer candidato a cargos públicos tem de merecer. Ele exorbitou do mandato de negociador que lhe foi atribuído, ele foi cúmplice na negociação de compensações que acabaram, via Escom, no bolso de banqueiros ou em parte incerta, ele foi responsável pela história das contrapartidas, ele é recordado por ter levado para casa centenas ou milhares de documentos quando deixou o Ministério. São empenhos a mais num caso tão nauseabundo.

Paulo Portas tem por isso razões de sobra para saber que jamais sobreviverá incólume aos ataques que o esperam. O despacho de arquivamento deixou escrito num papel com a chancela da Justiça que ele não agiu como se exigia a um ministro de Portugal. Fez dele uma menos-valia, uma companhia que traz mais problemas que vantagens.(...)

A sua presença na política lembrará sempre um passado de facilitismo e irresponsabilidade que ajudou a empurrar o país para a falência. A bem da decência e da transparência, está na hora de mudar de vida, por muito que receie ver o “seu” partido tornar-se um apêndice do PSD, por muito que lhe custe ver-se incluído no rol dos que, como Sócrates ou Ricardo Salgado, se tornaram os símbolos do ajustamento ético em curso no país. Quem fez o que fez no caso dos submarinos já não tem nada a fazer no país. A não ser alimentar as “nuvens negras” que Passos Coelho acredita terem desaparecido do país neste final de ano. 

José Pacheco Pereira - Público de 27-12-2014

A bancarrota de Sócrates, que existiu mesmo, with a little help from my friend Passos Coelho, foi o equivalente a deitar Portugal por uma ravina abaixo, o “ajustamento” de Passos é o equivalente a atirar Portugal para um pântano de areias movediças. Os dois são momentos complementares da mesma crise social, cultural, económica e política que assola o país desde 2008, e que é, em parte, um reflexo de uma crise europeia mais vasta. Em parte, mas não só.

Há componentes nacionais que nos caíram em má sorte, e que têm a ver com uma conjugação muito especial de incompetência, ideias erradas, superstições e dolo. No dia em que se fizer uma verdadeira história destes últimos seis anos, só colocar o que cada um dos protagonistas pensava, disse ou fez numa sequência cronológica correcta mostrará como se foram destruindo todas as oportunidades, afunilando o caminho e tentando secar com zelo todas as alternativas. O problema é que essa tarefa de criar o deserto à volta teve eficácia, porque a política da terra queimada tem efeitos destrutivos e diminui de facto as opções dos que a ela sobrevivem. 

Tenho insistido nesta questão da cronologia rigorosa, até porque ela nos ensina muitas coisas sobre como é que evoluiu o processo nestes seis anos de lixo e, por isso, altera a nossa percepção sobre as relações de causa e efeito. (...)

Alguém pensa que este modelo atamancado em 2011-2, assente acima de tudo no “gigantesco aumento de impostos”, pode subsistir sem esses impostos? A herança de Sócrates foi um Tesouro vazio que dava para três meses, a herança de Passos Coelho é um “ajustamento” que só tem efeitos porque depende de um enorme assalto fiscal. Não existe “ajustamento” à Passos Coelho sem impostos elevadíssimos, centrados no trabalho e no consumo. Sem esses impostos tudo vem abaixo como um castelo de cartas, porque nenhuma transformação estrutural foi feita nem na economia portuguesa, nem no Estado. E as que foram feitas na sociedade, principalmente o empobrecimento selectivo da classe média, são todas inibitórias de qualquer genuíno crescimento.

O país foi gerido como o jogo de SimCity – primeiro gastou-se de mais, depois empobreceu-se de mais. Primeiro, o mayor virtual encheu a cidade de quartéis de bombeiros e esquadras da polícia, parques e circos ambulantes, com os índices de popularidade a aumentar. Depois veio a bancarrota e o novo mayor inverteu a receita, desatou a aumentar os impostos, cortou os serviços públicos. A cidade do SimCity começou a cair aos bocados, os incêndios a aumentarem, o crime alastrando, as pessoas a emigrarem. Não são duas políticas distintas, são duas faces da mesma política, uma o espelho da outra, ambas com efeitos perversos desastrosos para o país.

Pensam que houve muito mais sofisticação do que a que é preciso para “jogar” SimCity? Não, foi mesmo assim, com ideias simplistas e erradas, e toneladas de pseudo-ideologia no lugar da ignorância. Vamos pagar muito caro, estamos a pagar muito caro. Querem morrer rapidamente ou ficar muito feridos, caindo por uma ribanceira ou enterrando-se num pantanal?

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