Pela abolição do casamento civil
Todos sabemos que, em casos excepcionais, a lei permite que se quebre o vínculo entre pais e filhos, possibilitando que estes venham a integrar outra família e, inclusive, a ter novos pais. Trata-se, no entanto, de situações excepcionais, porque, nas relações da família, o princípio deve ser, obviamente, o de não permitir a quebra do vínculo. De facto ninguém compreenderia que uma lei impusesse tantos direitos e deveres a duas pessoas (neste caso, pai e filho) e, depois, permitisse que qualquer das partes quebrasse o vínculo por «dá cá aquela palha», designadamente porque já não há amor.
Alguém aceitaria, por exemplo, que um casal, seis anos após ter adoptado um filho, solicitasse na Conservatória o fim da filiação com o argumento de que, afinal, já não amava aquele filho e que se tinha apaixonado por outro que queria agora adoptar?
Ora, o casamento é uma instituição que assenta nos mesmos princípios de estabilidade e durabilidade que regem as relações familiares. Daí que nasçam para os cônjuges, com o matrimónio, um conjunto de direitos e deveres muito semelhantes aos da filiação. Acontece que, como parece hoje evidente, a esmagadora maioria das pessoas já não entende a relação conjugal como uma relação de família (que pressupõe um vínculo para toda a vida) mas como uma relação circunstancial e, em regra, efémera que apenas deve durar enquanto apetecer ou convier às duas partes.
Se todos reconhecemos que assim é (aliás, está à vista), a solução não passa, obviamente, por desvirtuar e esvaziar o casamento, conforme fez e defende o Partido Socialista, transformando-o numa aberração jurídica e numa instituição totalmente absurda e ridícula, mas pela abolição pura e simples do casamento civil. Na verdade, que sentido faz o Estado, por exemplo, manter o cônjuge em pé de igualdade com os filhos no direito à herança ou facultar-lhe o direito às pensões por morte, quando a relação conjugal é apenas circunstancial, só se mantendo à data da morte do cônjuge por mero acaso e por sorte?
Se marido e mulher são para ir trocando ao longo da vida e se os filhos são para toda a vida, não podem aqueles ter os mesmos direitos e deveres que estes. O Estado deve, por isso, lavar daqui as mãos. Cada um que viva como quer e com quem quer. E se houver alguém que pretenda tornar outro seu herdeiro, para além dos filhos, que faça testamento. É um problema onde o Estado não se deve meter. Uma coisa são as relações de família (que são para toda a vida), outra coisa são os afectos que duram enquanto duram e, em regra, duram pouco e cada vez menos.
Abril de 2008