As medalhas do centenário
Santana-Maia Leonardo
Um amigo fez questão de me enviar a lista das medalhas do centenário convencido provavelmente de que me escandalizaria, como se eu não conhecesse minimamente a lógica do nosso poder autárquico de que Abrantes é, aliás, o estereótipo.
“O caciquismo não é acessório ao regime. É o próprio regime”, proclamava António José de Almeida, em 1910. E cem anos depois nada mudou. É por isso absolutamente natural que os caciques aproveitem o centenário para distribuir as medalhas segundo o único critério que conhecem: arrebanhar o maior número de votos, manter o rebanho unido e homenagear as tais elites de que falou Marcelo nas comemorações do 10 de Junho. Ou seja, as tais elites que se deixaram corromper e que, nos últimos cem anos, sempre nos falharam.
As medalhas de “honra”, objectivamente, servem, por um lado, para premiar aqueles vultos que aceitaram pertencer à última comissão de "honra" do autarca ou que vão pastoreando o rebanho por conta dos apoios camarários, e, por outro, angariar novos vultos para a próxima comissão de “honra”.
É certo que nesta enorme lista existem pessoas (algumas já falecidas) que efectivamente mereciam melhor e menor companhia (a qualidade é um bem escasso) e que são usadas, manifestamente, para credibilizar e branquear uma cerimónia de auto-propaganda do caciquismo.
Nada disto, no entanto, é novidade. E não vale a pena aos medalhados e aos caciques ficarem melindrados comigo porque eu estou apenas a reproduzir, em voz alta, aquilo que toda a gente sabe e diz em voz baixa. Como canta Leonard Cohen: "Everybody Knows".