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COLUNA VERTICAL

"A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras.." (Aristóteles)

COLUNA VERTICAL

"A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras.." (Aristóteles)

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Como não me cansei de escrever ao longo dos últimos 30 anos e consta do meu livro "A Terra de Ninguém": "(...) com a abertura da torneira dos fundos comunitários, (...) os sucessivos governos empenharam-se em transformar a A1 no nosso Mediterrâneo interior, a verdadeira fronteira de Portugal e da cidadania portuguesa."

Ora, chegou a hora de "A Terra de Ninguém", onde reside o maior grupo de risco ao COVID-19, fechar a fronteira com Portugal para evitar a propagação do vírus.

É, de facto, revoltante assistir a filhos e netos que nunca tiveram tempo para visitar os seus pais e avós no interior do país, fugirem agora de Lisboa para se vir esconder debaixo das saias dos seus pais e avós, indiferentes ao facto de o seu comportamento colocar em risco as suas vidas.

E chegou agora a altura de começar a pagar o preço das nossas escolhas. 

Mas chamo desde já a atenção para os mais optimistas que pensam que o pagamento pode ser feito a pronto pagamento com uma quarentena de 15 dias: o pagamento vai ser feito obrigatoriamente a prestações e por muitos anos.

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Já estive, por duas vezes, no corredor da morte e, por duas vezes, a Vida foi condescendente comigo, ao contrário do que sucedeu com a minha sobrinha por quem não teve qualquer misericórdia, apesar de ser bastante mais nova do que eu. Tudo isto para dizer que, fazendo eu parte do grupo de risco à COVID-19, não me posso queixar se a Vida não me amnistiar de novo.

Devo confessar, no entanto, desde já, a minha absoluta ignorância relativamente a uma matéria sobre a qual a esmagadora maioria dos portugueses evidencia sinais de enorme sabedoria, a fazer fé na convicção com que se expressa nas redes sociais, ainda que com muitos erros de ortografia e de gramática.

Aristóteles, Edmund Burke, Einstein e Karl Popper, meus professores à distância, ensinaram-me que o ignorante tem certezas onde o sábio tem dúvidas. Por isso, é sempre bom ouvir os conselhos dos ignorantes que são os únicos que verdadeiramente sabem de tudo e mais alguma coisa. E é isso precisamente que eu faço, ainda que, por espírito de contradição, nunca siga os seus conselhos.

Aliás, em qualquer circunstância (boa ou má), tenho sempre presente a parábola do Mestre Zen. Quando alguém o procurava para lhe dar conta da sua alegria (“Mestre, veja a sorte que eu tive! O meu filho fez anos e deram-lhe um cavalo!”) ou de uma desgraça (“Mestre, veja a grande desgraça que me aconteceu! O meu filho caiu do cavalo e partiu uma perna!”), o Mestre Zen, na sua imensa sabedoria, a todos respondia: “Veremos!".

Ora, como ensina o mestre Zen, muitas vezes são os acontecimentos, as circunstâncias e as decisões que aparentemente parecem ser as piores, como é o caso da queda do cavalo, que acabam, a curto ou médio prazo, por se revelarem excelentes (por ter partido a perna, o filho já não foi chamado para a guerra que, entretanto, rebentara) e vice-versa.

E há uma regra que me habituei a seguir que raramente falha: quando a maioria dos portugueses, hoje tão bem representada por Marcelo Rebelo de Sousa, defende convictamente uma solução, eu desconfio dela... ("Veremos!", como diz o Mestre Zen).

No entanto, em situações de “alerta vermelho”, como é o caso, respeito sempre a cadeia de comando, como aprendi no serviço militar, apesar de saber que o “espírito de corpo” é um conceito desconhecido por estes lados.

Santana-Maia Leonardo - Diário As Beiras de 25-03-2020

15 Mar, 2020

A Pandemia do Medo

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Quando ouço e leio hoje cronistas, comentadores e gente anónima falar em guerra mundial quando pronunciam o nome da COVID-19, ao mesmo tempo que correm a fechar-se em casa e a esconder-se debaixo das mantas...

Na II Guerra Mundial, recordo, centenas de milhares de pais americanos enviaram os seus jovens filhos saudáveis para a frente de batalha na Europa, sacrificando as suas vidas, para enfrentar o vírus do nazismo. Isto é que é estar em guerra.

Agora existe o risco de pessoas como eu ou os mais idosos poderem morrer... Se isso me acontecer, não é agradável nem para mim, nem para aqueles (poucos, muito pouco) que me estão próximos, mas não  tem comparação com a morte em massa de jovens saudáveis como aconteceu na I e II Guerras Mundiais.

Temos, obviamente, de ter alguns cuidados e procurar cumprir as indicações de quem tem essa responsabilidade. Mas todos nós também conhecemos a história da Bela Adormecida: apesar de viver encerrada no castelo, quando ia fazer 16 anos, e os pais terem mandado cortar todos os picos do reino para evitar de se picar, isso não evitou que se picasse.

E, apesar da esmagadora maioria dos portugueses ser pensionista, funcionário público ou receber prestações sociais, temos todos de ter também consciência que não é possível um país inteiro sobreviver fechado em casa em regime de bar aberto, meses a fio, até porque o dinheiro só é importante se se puder comprar alguma coisa com ele. E, se toda a gente ficar fechada em casa, rapidamente deixa de haver o que comprar e o que comer, para já não falar nos cuidados de saúde que, para serem prestados, exigem a mobilização de centenas de milhares de pessoas que também têm filhos e família (médicos, enfermeiros, farmacêuticos, fornecedores, funcionários, bombeiros, seguranças, autoridades, transportadoras, empresários, operários, etc. etc.)...

Ou vamos dividir os portugueses em brancos e pretos: uns ficam em casa com salário garantido e direito a férias, quando o vírus permitir; e os outros vão trabalhar para garantir que não falte nada àqueles que ficam fechados em casa...

Santana-Maia Leonardo - Diário As Beiras de 18-03-2020

acordodeparis-0.jpgSe o COVID-19 é uma tragédia para os humanos, está a ser uma benção para a Natureza.

Os níveis de poluição caíram abruptamente e as metas do acordo de Paris estão quase a ser atingidas.

É mesmo caso para dizer que a Natureza se chateou e obrigou os humanos a cumprir o Acordo de Paris sobre as alterações climáticas de forma coerciva.

Santana-Maia Leonardo

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Todas as comunidades humanas, mais dia, menos dia, têm de enfrentar situações de grande adversidade e calamidades, como é agora o caso da COVID-19. E se os valores de cidadania são sempre de valorizar, porque contribuem para um crescimento e desenvolvimento saudável das sociedades, assente na confiança nas instituições e na justiça das decisões, são fulcrais para enfrentar situações de grande adversidade ou de calamidade.

Ora, a Revolução de Abril contentou-se em derrubar a ditadura, acabando por entregar o poder e as diferentes instituições a gente sem quaisquer escrúpulos, para quem a conquista e a manutenção do poder eram o seu único objectivo, não olhando a meios para o conseguir. E quem não perfilhasse a ideologia do “chico-espertismo” e do “salve-se quem puder” era gozado e humilhado publicamente como se a seriedade e a honestidade fossem arcaísmos típicos da Idade da Pedra.

O municipalismo transformou-se, assim, na grande escola dos valores do Portugal de Abril. Quem conhecer como funciona uma pequena câmara municipal, conhece o funcionamento do país e de todas as suas instituições. Se olharem para todos os escândalos (governo, câmaras, tribunais, administração e autoridades públicas, bancos, clubes de futebol, comunicação social, etc), que vão saltando para a ribalta cada vez que alguém dá um pontapé numa pedra, todos têm o mesmo padrão cultural das pequenas autarquias de província: o amiguismo, a cunha e o compadrio. E ai de quem, neste caldo de cultura, não faça um favor a um amigo bem colocado!... Temos de nos ajudar uns aos outros, não é? É assim que se chega a ministro, a deputado e a presidente disto ou daquilo.

A formação desportiva e o serviço militar obrigatório, numa sociedade com as limitações culturais da portuguesa, são peças-chave para interiorizar valores e comportamentos fundamentais, como é o caso da honra (trave-mestra do edifício dos valores), do espírito de missão e do espírito de corpo. O Espírito de Corpo é essencial para a sobrevivência de qualquer comunidade: cada cidadão deve não só desempenhar, com a máxima seriedade e competência, o papel que lhe está socialmente atribuído como confiar que os outros fazem o mesmo.  

Acontece que o serviço militar obrigatório foi desmantelado, depois de ter sido ridicularizado. E a cultura desportiva resume-se a isto: “o que importa é ganhar nem que seja com um golo com a mão e em fora-de-jogo”. Com esta mentalidade e neste caldo de cultura do “salve-se quem puder” e “com o mal dos outros posso eu bem”, é impossível que alguém possa confiar em quem quer que seja, quanto mais em governantes e em dirigentes que toda a gente conhece de ginjeira e sabe como lá chegaram.

Resumindo: ainda há portugueses honestos? Há. Mas não generalizemos…

Santana-Maia Leonardo

11 Mar, 2020

Liberdade

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(...) Talvez a liberdade seja uma ideia tão subversiva em si mesma que não se adapta ao mais fundo da natureza humana. Em muitas ocasiões tenho reparado que muitos preferem ter alguém que lhes ordene tudo, mesmo o absurdo, do que terem a liberdade e a responsabilidade por si mesmos.(...)

E a pobreza é má conselheira: na pobreza, os povos preferem uma ditadura que a todos nivela na miséria a uma liberdade que deixa cada um entregue à sua sorte. (...)

Miguel Sousa Tavares - Expresso de 9-3-2013