A Verdade
No julgamento de Cristo, segundo o Evangelho de S. João, Pilatos faz a famosa pergunta: “Que é a verdade?”
Em Portugal, não conheço nenhum português que não se professe um amante da “Verdade”. No entanto, quando a verdade não lhes convém, remetem, de imediato, a descoberta da verdade para os tribunais. E todos sabemos porquê: quem não tem razão deposita sempre nos tribunais a última réstia de esperança de lhes virem a dar razão.
Ora, não há maior cinismo e hipocrisia do que remeter para os tribunais a descoberta da verdade. A verdade judicial NUNCA é a VERDADE. A verdade judicial, na melhor das hipóteses, é a VERDADE POSSÍVEL, para já não falar dos casos em que é a VERDADE CONVENIENTE. E isto não tem a ver nem com os juízes, nem com os procuradores, nem com as leis.
Para que percebam o que estou a dizer, dou-lhes um exemplo prático que é do meu conhecimento pessoal. Imaginem que são vereadores e a aprovação de um projecto depende do vosso voto. O dono do projecto entra no vosso gabinete e propõe-lhes comprar o voto em notas. Como são pessoas sérias, não aceitam o que lhes é proposto.
Agora imaginem que decidem denunciar o caso ao Ministério Público. Como é evidente, o processo não só é arquivado por falta de provas (é a vossa palavra contra a palavra do corruptor), como ainda se arriscam a ser arguidos num processo de difamação instaurado pelo corruptor e andar nas bocas do mundo. Vergonha é precisamente o que este tipo de gente não tem.
E termino fazendo-lhes a mesma pergunta de Pilatos com que começámos esta conversa: Que é a verdade? A verdade é aquilo que se passou efectivamente no vosso gabinete ou o que resulta do processo judicial que absolveu o corruptor?
Santana-Maia Leonardo