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COLUNA VERTICAL

"A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras.." (Aristóteles)

COLUNA VERTICAL

"A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras.." (Aristóteles)

19 Jan, 2022

A chave do palheiro

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O que se passou com as agressões a imigrantes em Odemira por militares da GNR não só não é uma caso excepcional, como nos querem fazer crer, como existe um ditado popular que explica este tipo de comportamento que se tornou um padrão nas instituições portuguesas, seja nas forças de segurança, no SEF, nos tribunais, nas autarquias, na Administração Pública, nas associações e nos clubes: “se queres ver um pobre soberbo, dá-lhe a chave do palheiro.”

Como disse há muitos anos Edmund Bürke, «o mundo é um lugar perigoso de se viver, não por causa daqueles que fazem o mal, mas sim por causa daqueles que o vêem fazer e deixam acontecer.» No entanto, em Portugal, é necessário mais do que coragem para que aqueles que vêem impeçam que aconteça. É necessário ter vocação de bombista-suicida.

É bom não esquecer que quem tem o poder de legislar e punir é precisamente quem tem a chave do palheiro. E sem gravação vídeo ou áudio divulgada na tv, não há nada que consiga abalar o poder da palavra de quem tem a chave do palheiro e que faz sempre fé em juízo, mesmo quando salta à vista desarmada a manifesta falta de juízo. A nossa legislação penal e disciplinar é naturalmente, por um lado, extremamente dissuasora e repressiva para quem queira denunciar este tipo absolutamente execrável de comportamentos e, por outro, extremamente protectora de todos aqueles que têm a chave do palheiro.

Quem denuncia fica completamente isolado e desprotegido, até porque não há uma única testemunha que queira corroborar a denúncia. Com efeito, ninguém quer depor contra quem tem a chave do palheiro. Por sua vez, quem tem a chave do palheiro consegue arranjar as testemunhas que quiser para jurarem que é mentira o que toda a gente sabe que é verdade.

Santana-Maia Leondo - A Ponte de 17-1-2022

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Devo começar por chamar a atenção de André Ventura e dos seus apoiantes que se quiserem instaurar em Portugal uma ditadura das pessoas de bem vão ter de recorrer à imigração em massa, porque, em Portugal, não existe, neste momento, gente suficiente para garantir sequer o funcionamento do governo...

Há por aí muita gente que acha que o problema português é do sistema e que facilmente se resolvia com a importação dos modelos estrangeiros dos sistemas de saúde, de justiça, eleitoral, etc. etc.

Acontece que, tal como no futebol, mais importante do que os sistemas é a qualidade e a seriedade dos intervenientes. Ou seja, não adianta mudar de tractor se o problema é do tractorista.

E Portugal já viveu esta experiência de copiar uma lei alemã que se revelou um verdadeiro desastre quando foi aplicada em Portugal: o adiamento de audiências de julgamento com base no atestado médico.

Na Alemanha, o número de audiências de julgamento com atestado médico era praticamente inexistente, enquanto em Portugal, os juízes lembravam-se sempre de marcar os julgamentos para o dia em que as pessoas estavam doentes. Que grande pontaria!

Como é bom de ver, isto só sucedia, porque toda a gente (juízes, advogados, procuradores, médicos, testemunhas e arguidos) se conformavam com um caso manifesto de corrupção. Mas esta é a verdade nua e crua: quem quiser trabalhar em Portugal não consegue sobreviver sem pactuar com alguns níveis de corrupção que estão tão generalizados que já fazem parte do dia a dia das putativas pessoas de bem.

O português comum, quando se fala nos pequenos ilícitos, desvaloriza-os sempre, contrapondo-os com a grande criminalidade, que essa é que devia ser combatida e não os pequenos ilícitos.

Em 1969, na Universidade de Stanford (EUA), o Prof. Phillip Zimbardo realizou uma experiência de psicologia social que veio a ser conhecida pela Teoria das Janelas Partidas e que tanto sucesso teve no combate à criminalidade em Nova Iorque. Da experiência levada a cabo pelo Prof. Zimbardo resultou a seguinte conclusão: uma comunidade condescendente com os pequenos ilícitos é o ecossistema perfeito para o desenvolvimento e a propagação da criminalidade.

E já que comecei este artigo com uma chamada de atenção a André Ventura e aos seus apoiantes, termino com uma chamada de atenção aos apoiantes dos auto-intitulados partidos democráticos. O Chega é o sintoma de uma doença muito mais grave e contagiosa do que a COVID-19, mas não é a doença. A doença é a corrupção que se apoderou de todo o tecido social e de todas as instituições portuguesas, sendo o PS e a sua variante PSD os principais veículos de transmissão do vírus.

Santana-Maia Leonardo

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A formação desportiva, no verdadeiro sentido da palavra, é absolutamente essencial para a formação do indivíduo como cidadão. Acontece que, em Portugal, não só não existe formação desportiva como está implantada e generalizada a cultura da deformação desportiva.

A formação desportiva implica, desde logo, que todas as crianças e jovens, independentemente das suas aptidões desportivas, tenham acesso à mesma. É mais importante para a formação do cidadão a formação desportiva do que qualquer outra disciplina, designadamente o Português e a Matemática.

A formação desportiva destina-se, importa salientar, a formar cidadãos e não a formar Cristianos Ronaldos ou Messis. Ou seja, destina-se a cultivar nas crianças e nos jovens a cultura do fair play, do respeito pelos outros, da lealdade, do trabalho em equipa, da superação, do sacrifício, da ambição e da aceitação, sem dramas, da vitória e da derrota como elementos naturais da própria competição e da vida.

Os jovens têm de perceber que os vencedores são pessoas que perderam muitas vezes. A maioria dos portugueses confunde o carácter do vencedor, que é moldado na adversidade, com o carácter dos lambe-botas, que têm por hábito colar-se aos vencedores. Como disse Churchill, «O sucesso é ir de fracasso em fracasso sem perder entusiasmo.»

Se todas as crianças e jovens tiverem acesso a uma verdadeira formação desportiva, quando chegarem a adultos, podem nem sequer vir a praticar qualquer desporto, mas serão certamente melhores cidadãos, em todos os sentidos: melhores profissionais, melhores pais, melhores companheiros e, inclusive, melhores espectadores.

E é precisamente por esta razão que, nos países civilizados, a formação desportiva é uma obrigação do Estado e da escola pública e não dos clubes.

Santana-Maia Leonardo - A Ponte de 10-1-2022