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A liberdade de expressão é a trave-mestra das sociedades abertas, como ensinava Karl Popper: “Quando evitar ofensas constitui a nossa principal preocupação, rapidamente se torna impossível dizermos livremente seja o que for.” Portugal viveu trezentos anos sob o jugo da Inquisição e cinquenta anos em ditadura, o que significa que somos um povo que não só não valoriza muito a Liberdade como vive bem sem ela.
A Santa Inquisição usou a violência, tortura, ou a simples ameaça da sua aplicação para extrair confissões dos hereges. O dogma não se discute. E o próprio Galileu foi obrigado a jurar, por todos os santinhos e pela sua saúde, que a Terra não se movia.
Hoje a situação não é muito diferente. Mudaram os inquisidores e os dogmas, mas o método mantém-se. Ainda recentemente, em Madrid, Jesús Luis Barrón López, professor de Biologia há 25 anos, foi suspenso por ter dito que só existem dois sexos: o masculino e o feminino. Neste momento, já não me atrevo sequer a emitir opinião sobre esta matéria, mas, de uma coisa tenho a certeza: Galileu, se vivesse hoje, teria de jurar que havia sexos para todos os gostos e que a heterossexualidade era uma aberração cultural que não tinha qualquer base científica, sob pena de ser atirado para a fogueira das redes sociais e expulso da comunidade científica.
No entanto, é importante não confundir alhos com bugalhos. Uma coisa é o género gramatical, outra coisa é o género sexual. São duas coisas diferentes e que não se confundem. Uma pedra é do género feminino, do ponto de vista gramatical, mas não é do género feminino, do ponto de vista sexual. Penso que não é preciso ser muito inteligente, nem letrado, para perceber esta evidência.
Do ponto de vista gramatical, em latim, o género masculino é o género neutro. Ou seja, não era nem masculino, nem feminino, do ponto de vista sexual.
Do ponto de vista gramatical, o género marcado era o feminino. Ou seja, gramaticalmente, o género masculino era unissexo, enquanto o género feminino era apenas feminino.
Passando a exemplos práticos. Se eu disser: “Chamem um médico!” e me trouxerem uma médica, foi cumprida a minha solicitação. Agora se eu disser: “Chamem uma médica!“, a solicitação não é cumprida se me trouxerem um médico. Se eu quiser um médico-homem, tenho de dizer: “Chamem um médico que seja homem“. Alguma dúvida?
Não deixa, no entanto, de ser esclarecedor que sejam precisamente aqueles que querem acabar com os sexos que vejam sexo em tudo. O que só vem demonstrar que Freud tinha razão. Todo o inquisidor é um tarado sexual.
Santana-Maia Leonardo - O Mirante de 30/7/2022
Existe uma reforma que é a mãe de todas as outras e sem a qual estas estão votadas ao insucesso. Refiro-me à reforma das mentalidades.
Os portugueses que vivem e residem em Portugal, de uma forma geral, têm horror a correr riscos pelo que se agarram aos cargos remunerados pelo Estado como os banhistas que não sabem nadar, nem querem aprender, à borda da piscina. E dali não saem, tornando a piscina imprópria para quem queira praticar natação, tanta é a gente que se amontoa na sua borda.
É, por isso, natural que os portugueses mais ambiciosos, ou seja, que não estejam dispostos a viver agarrados à borda da piscina, se vejam obrigados a partir para outros países onde o mérito seja reconhecido e possam dar largas à sua ambição.
A cultura do risco e do mérito numa sociedade naturalmente competitiva educa-se desde o berço. Mas, para isso, é fundamental que a derrota ou o insucesso não se transforme num estigma. Ora, reside precisamente aqui o problema português. Com efeito, quando ganham, são os maiores e tratam os vencidos com uma arrogância extrema. Aliás, sentem um enorme prazer em humilhar os vencidos. É precisamente por esta razão que a maioria dos portugueses escolhe sempre o lado dos vencedores. E isto é tão evidente que, ao contrário do que sucede em toda a Europa, 94% dos portugueses são dos três clubes ganhadores.
É natural que um clube de uma grande cidade tenha mais adeptos do que um clube de uma pequena cidade. O que não é natural é que uma cidade como Faro, por exemplo, tenha mais adeptos do Benfica e do Sporting do que do Farense. No entanto, basta ler a explicação para ser benfiquista (e não portista) do conhecido psicólogo Júlio Machado Vaz, que nasceu e reside no Porto, na sua entrevista ao jornal A Bola, para ficarmos esclarecidos: "O facto de o Benfica ganhar quase tudo na década de 60 (...) tinha tudo para me atrair."
Ora, o que é normal, em qualquer país do mundo, excepto em Portugal, é, numa liga de clubes, cada um torcer pela clube da sua cidade, num campeonato inter-escolas, cada um torcer pela sua escola, e, num campeonato inter-turmas, cada um torcer pela sua turma, independentemente de a sua turma, escola ou cidade ter mais ou menos hipóteses de ganhar.
Acontece que, na sociedade portuguesa, o epíteto de “perdedor”, com que os canalhas gostam de estigmatizar os seus adversários, é de tal forma humilhante que a esmagadora maioria prefere não arriscar, para não correr o risco de fracassar, optando pela segurança dos empregos do Estado e por ser adepto dos partidos e clubes vencedores. E, mesmo assim, sempre que perdem é um drama. Ai de quem perde. É por isso que também vivemos num país onde os fins justificam os meios e os casos de corrupção só têm relevância e interesse se puderem ser usados como pedras de arremesso contra os adversários.
Santana-Maia Leonardo - O Mirante de 14-1-2022
No dia 26 de Julho de 1990, dia de Sant'Ana e dia dos avós, faleceu o meu avô Santana, o homem que mais me marcou e que eu mais admirei em toda a minha vida.
António Maria de Santana Maia, de seu nome, começou por ser meu avô e acabou por ser meu pai e o meu mestre. Dinheiro, propriamente dito, nunca me deu. Mas aprendi com ele que só dá dinheiro aos filhos quem não tem mais nada para lhe dar. Ou, como ele me dizia: «só se deve dar dinheiro a um filho quando ele não precisar dele».
Quando o conheci, já era um homem considerado e respeitado não só em Ponte de Sor, onde fixou residência, como no distrito de Santarém e Portalegre. Advogado brilhante e conceituado, muito para além das fronteiras destes dois distritos, foi ainda notário, presidente da Câmara Municipal de Ponte de Sor e agricultor.
Como Presidente da Câmara, cargo que ocupou apenas durante um curto período e com a condição de não se filiar no partido do regime, a ele se deve o primeiro Plano de Urbanização de Ponte de Sor, conseguido contra muitas resistências, em virtude do mesmo prever a expropriação de terrenos de algumas famílias importantes e com peso em Ponte de Sor. E como Presidente da Câmara soube ainda resistir à tentação de utilizar o cargo e a sua influência para impedir, com o eclodir da guerra colonial em 1961, que o seu filho embarcasse para o Norte de Angola num dos primeiros contingentes de soldados portugueses. Enquanto, para uma larga maioria, os cargos públicos são um meio para obter favores, para outros, impõem-lhes o dever moral de dar o exemplo.
Homem íntegro, de palavra, de convicções e de coragem, soube guiar toda a sua vida pelos padrões morais do berço humilde onde nascera. A sua cultura impressionava. Nunca houve uma palavra, um conceito, uma dúvida, um livro de que eu lhe falasse ou que lhe perguntasse que ele não conhecesse ou que não soubesse a resposta.
E apesar de ser de pequena estatura (1,60m de altura), foi até hoje o único homem ao pé do qual eu, com o meu 1,92m, me senti sempre pequeno.
Santana-Maia Leonardo - A Ponte de 25/7/2022