Mas afinal o que é um alentejano?
Santana-Maia Leonardo
Se não sabe o que é um alentejano, já vai sendo tempo de saber para não fazer figuras tristes. Eu sei que não há muitos por aí… A qualidade sempre foi um bem escasso. E, neste país, uma pessoa tem de explicar tudo tim-por-tim e, mesmo assim, têm dificuldade em perceber.
Em todo o caso, desta vez e à boa maneira alentejana, eu vou explicar bem devagar como se quem não soubesse o que é um alentejano fosse muito burro como efectivamente não pode deixar de ser.
A maioria das pessoas que não são alentejanas acham que um alentejano é um indivíduo que nasceu no Alentejo. Ora, é preciso não ter dois dedos de testa para não conseguir distinguir um alentejano de um indivíduo que nasceu no Alentejo mas que não é alentejano.
Qual é que é a diferença? Ora essa!... Então está-se mesmo a ver: o indivíduo que não é alentejano acha que é alentejano por ter nascido no Alentejo. Esta é que é a grande diferença. Qual é que é o alentejano que acha que é alentejano por ter nascido no Alentejo? Só se fosse estúpido é que pensava isso que é precisamente aquilo que um alentejano não é.
Eu sei que isto é um bocadinho difícil de perceber para quem não é alentejano, até porque é preciso ter um bocadinho de inteligência que é precisamente aquele bocadinho que mais falta por aqui. Mas eu vou tentar explicar. Ao contrário dos transmontanos, alfacinhas, beirões, minhotos e algarvios, um alentejano não se define pelo local do nascimento, até porque um alentejano não é esquisito: um alentejano nasce num sítio qualquer. Desde que não falte o pão, bem entendido...
Como já aqui expliquei um dia, ninguém nasce alentejano, é-se alentejano. O alentejano tem a ver com o SER e não com o NASCER.
Em todo o caso, não sei para que estou aqui com tantas explicações quando Sá de Miranda, no poema “A El-Rei D. João”, há mais de 400 anos, fez o retrato do alentejano com tanto rigor e pormenor que é preciso mesmo ser muito ignorante para não saber o que é um alentejano.
Como escreveu Sá de Miranda, um alentejano é precisamente isto sem tirar nem pôr: “Homem de um só parecer,/ D'um só rosto, uma só fé,/ D'antes quebrar, que torcer, / Ele tudo pode ser/ Mas de corte homem não é.”